Nesse fim de semana, com vontade de voltar às noites paulistanas – que eram o que me mantinha ligado à cidade embora todos os pesares, mas que estou distante por n motivos –, chamei diversos amigos próximos para ir a uma festa que se popularizou durante os anos. A ideia era só confraternizar e ter algumas (poucas) horas de simplesmente “foda-se”. Alguns momentos em que a única preocupação é manter a não-preocupação. Que saudade de tal sentimento!
Mais uma vez, porém, a tarefa foi hercúlea. Mesmo com a bondade do DJ em disponibilizar algumas entradas de graça e outras a um preço bem menor do que o normal, a aversão era geral. “Ah, mas tal DJ não é o mesmo que era”, “ah, mas o público de lá mudou muito”, “ah, essa festa não dá para defender”. Só digo uma coisa: foda-se. Eu não iria ficar a festa inteira a conversar com o público com o qual eu não me identifico, não iria fazer uma análise histórica sobre a evolução de uma festa de amigos que cresceu, não iria tentar defender algo que nem é meu e nem sei o que motiva a continuidade, a mudança, ou até mesmo a decisão sobre as músicas. Era apenas um lugar para dançar e, de novo, tacar o foda-se. Algumas horas de apenas celebração. No meio da discussão, desafiei meus amigos a falarem de uma única festa em São Paulo que fosse legal e que eles não considerassem como “tristeza”. Ninguém falou nada. Logo concluí que o problema, então, não era a tal festa, mas todas as festas que acontecem na noite paulistana.
Quando ficamos tão chatos?! Passamos os dias a questionar os “coxinhas”, afirmando seu extremo conservadorismo, mas ao mesmo tempo ficamos a podar a nossa própria felicidade. Quando São Paulo virou essa cidade árida, em que nada pode ser feito sem uma crítica qualquer? Quando os meus gostos, meus sentimentos, minhas ideias, viraram pautas extensivas e de extremo policiamento? Vivemos, hoje, além do policiamento militar, o policiamento moral e do “bom” gosto. E essa vigilância extensiva não é feita pelos outros, pelo diferente, mas sim por aqueles que consideramos como iguais. É sério que tudo que faço precisa ser efetivamente diagnosticado e julgado? Quando o “foda-se” foi excluído de nossa vivência?
Há umas semanas, uma amiga querida me ligou para ir tomar uma cerveja em uma sexta fria, pois ela não aguentava mais ler tantas críticas para qualquer postagem nas redes sociais. Qualquer pio e ação era motivo para longas e discursivas análises sobre o quão determinado comportamento era considerado execrável. Ou inútil. Ou que o real problema “é a fome”. Ou que determinado partido político estava a destruir o país (isso para ambos os lados). Ou que o problema era o BNDES. Sei lá, qualquer um pode ser considerado. O que importa aqui é que a polícia do julgamento, da moral, do “bom” gosto, está constantemente efetiva em nossas vidas, moldando silenciosamente a forma como vivemos nossa cidade e xs nossxs queridxs ao redor. Rasteiramente, como causam todas polícias, vamos ficando engessados, emoldurados, inaptos a construir qualquer outra atividade nova. Ficamos à mercê de um gosto alheio fantasmagórico, que define o que deve ser “bom” e o que é “ruim” sem nem ao menos sabermos quais são os parâmetros para a classificação. Lembram daqueles depoimentos que diziam que a pior censura durante a nossa ditadura militar era a mental, que ficava instaurada em nosso ser? É o que essa polícia do julgamento, do “bom” gosto, está aos poucos a estabelecer em nossas vidas. E, aí, quando conhecemos qualquer manifestação cultural nova, seja hipster ou não, incontrolavelmente já achamos que deve – ou tem que – ser ruim, apenas pelo piloto automático do julgamento estar ligado há tempos e nós que não percebemos.
Eu quero voltar a ter a liberdade de gostar de algo “ruim”. Eu quero poder reunir xs amigxs pela própria reunião e não pelo o que aquela determinada festa pode – ou não – dizer em parâmetros de gosto que nada me dizem respeito. Eu quero voltar a gostar de qualquer coisa porque eu, como ser emotivo, simplesmente gosto. Por que eu tenho que explicar tudo?!
Quando ficamos tão chatos?!