Somos todos hackers!

“A arte é uma arma carregada de futuro”. Essa frase foi apresentada a mim por um filme que documenta de forma mista (ficção e entrevistas) o grupo de teatro espanhol homônimo à película, “Noviembre”. O grupo de amigos tinha como preceito subverter a lógica do teatro e do meio artístico. Em vez de palco, escolheram as ruas. Em vez de serem remunerados, preferiram a gratuidade. Aliás, pode-se falar que eles não subverteram, eles hackearam a lógica do teatro.

Rolou na lista da Casa de Cultura Digital nestes dias um artigo de um coletivo também espanhol chamado Comunes. Eles estão interessados em propagar o conceito de bens comuns, ou seja, bens coletivos que podem ser usados por todos, como “as sementes, as ruas, o software livre e a Wikipedia”. A estratégia é começar a propagar, em um primeira etapa, os conceitos e ideias de cultura e conhecimento livres e, depois, partir para estratégias mais materiais, como luta contra a patente de sementes, a propriedade de recursos naturais e a restrição da infraestrutura comunicacional (como os espectros de rádio e televisão).

Esse artigo, intitulado “Hack for your rights – hackea por tus derechos”, exemplifica que, na verdade, a ética hacker pode ser aplicada em vários – se não quaisquer – setores da sociedade. Não é preciso que se fique restrito apenas aos computadores ou códigos programacionais. “Hackear” algo é subverter os princípios e estruturas originais e criar uma outra, diferente, alternativa. A ideia de ser um “criminoso informático” é ultrapassada.

Um exemplo prático é, inclusive, o Ônibus Hacker. A comunidade por trás do veículo, a Transparência Hacker (com já mais de 800 integrantes), não é composta apenas por desenvolvedores ou pessoas que entendem de códigos. Pelo contrário. É composta por uma pluralidade de profissionais gigantesca – aliás, é até bom que seja assim. O “hacker” vem dos meios para chegar à transparência de dados públicos. Se o governo, que legalmente deveria fornecer os dados aos cidadãos, não o faz, cabe aos cidadãos encontrar aquilo que o é de direito na forma que conseguir (sem, claro, ferir leis ou morais). O “hackear” é a subversão da lógica em vigor. É achar novos meios para as atividades do dia-a-dia. E até a terminologia demonstra isso. “Hackear” é o processo de fazer “hacks”, ou seja, rachas, cortes.

O texto do coletivo pega exatamente neste ponto, de que qualquer um pode ser um hacker. Como ele diz, “nós escrevemos essas linhas para incentivar a jogar, a hackear, a sermos ‘lenhadores’ sociais. Nosso objetivo deveria ser limpar ou cortar as maçãs podres que estão afetando o nosso bosque coletivo e o nosso futuro. Nós o desafiamos a jogar esta partida simultânea por um mundo melhor”. E, o jogo, pode ser qualquer um que você se sinta à vontade, podendo ser desde biohacking até subvertendo os papéis da arte.

É aí que entra o grupo “Noviembre”. Eles acreditavam em uma outra espécie de encenação que não levava em conta apenas o palco e a interpretação. Era a mistura entre a encenação e a realidade. Era usar as ruas, os bens coletivos, como palco para criar consciência sobre questões da realidade. Uma das peças do grupo foi simular um assassinato em plena luz do dia, com sangue e tudo o mais. Isso, logo após os ataques terroristas à Madrid. Foi uma forma de expressar a sensação de medo, de morte, que assolava a cidade. É o “teatro documental”, que expressava as questões sociais em interpretações mais do que reais. Hackearam a farsa tão discutida em palcos do mundo inteiro.

E você? Como você pode virar um “lenhador” social e ajudar a tirar as maças podres de nossos bosques comunais? Hackeie!

http://www.youtube.com/watch?v=HiIoe0IEdTM

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