Quem pode destruir ‘arte’?

Neste domingo, 16, o mundinho da arte contemporânea foi pego de surpresa por um “vândalo” (como a mídia tem chamado o autor do caso) que quebrou um dos vasos de uma obra do artista chinês Ai Wei Wei. A peça, que é considerada ter sido feita há mais de 2 mil anos e pertencente à dinastia Han, faz parte de uma instalação de Wei Wei em que ele próprio “vandaliza” diversos desses vasos e, ainda, mostra o registro de uma performance em que ele próprio… quebra um deles!

O “vândalo”, Maximo Caminero, declarou que o ato foi um protesto contra a exibição de artistas internacionais pelo Perez Art Museum Miami. Ou seja, um meio simbólico para chamar a atenção a uma glamurização pelos grandes museus do que vem de fora e o esquecimento do que é produzido localmente.

A obra de Wei Wei, intitulada “Dropping a Han Dynasty Urn” (1995), também foi usada pelo próprio museu em uma de suas fachadas para promover sua exposição. Em horários noturnos, o museu projetou a documentação da performance em que o artista quebra um desses vasos, sobrepondo os registros com trechos da Primeira Emenda da Constituição dos EUA, que garante a liberdade de expressão no país. Em uma das sobreposições, há uma citação do próprio artista: “Seus próprios atos dizem ao mundo quem você é e qual tipo de sociedade você acredita”.

Creio que Caminero deixou bem claro quem ele é e qual seu problema com a sociedade.

Wei Wei é um artista congratulado no mercado da arte norte-ocidental por defender a liberdade de expressão em um país em que a censura é algo corriqueiro. Esta obra específica pode ser interpretada por diferentes pontos de vista. Ao mesmo tempo em que pode demonstrar o esquecimento da cultura milenar chinesa por uma ideia de progresso capitalista, há também o argumento de que a liberdade de expressão deve ser maior do que qualquer imposição histórica defendida e definida por governos autoritários. Deixo o leitor livre para qualquer interpretação.

De qualquer forma, Wei Wei, em vez de congratular a livre expressão do “vândalo”, declarou que não se pode destruir algo que não te pertence. Ora, por mais que Wei Wei tenha comprado os vasos há mais de 20 anos, eles não seriam pertencentes à história da cultura chinesa? Ao usar vasos milenares para suas obras, não seria o próprio Wei Wei o vândalo em questão?

Neste ponto, chega-se à discussão sobre o que o mundinho da arte contemporânea (ou o seu próprio paradigma) considera como um real ato artístico. Qual a diferença entre Wei Wei e Caminero? E se até sua performance faz o mesmo, há uma real distinção entre os dois?

Caminero, porém, deve responder por um processo e pode pegar até 5 anos de prisão. Wei Wei, por sua vez, pode receber um seguro que chega a US$ 1 milhão.

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