É muito difícil construir algo novo. E ainda mais quando o novo não é apenas o resultado, mas o processo que envolve a criação disso que é novo. Fazer com que os envolvidos, tanto na construção, quanto no produto final, entendam todos os conceitos que estão ao redor e que norteiam esse novo, essa construção, esse inédito, é bem difícil.
A rede potencializou e divulgou os preceitos da colaboração, do fazer-junto, do elaborar sem hierarquias. Agora, aplicar isso em projetos cotidianos é uma tarefa árdua. Como pensar em política sem pensar no resultado em si, mas no processo como forma de orientar decisões? Como criar eventos grandes em vias públicas da cidade em que todos os milhares de participantes entendam que não é um evento de uma empresa ou governo, mas criado por pessoas comuns, como eu, você e meu vizinho? E como orientar as críticas para não somente ser uma opinião, mas uma construção de algo novo?
Durante essa semana participei de duas discussões que levantaram várias dúvidas sobre esse “fazer novo”: um era sobre a campanha política de um candidato à prefeitura, e o outro sobre a organização de mais um evento no Minhocão, em São Paulo. Em ambos os casos, o grande desafio foi trazer a compreensão de que, sim, pode ser feito algo novo, e o processo pode ser bem mais interessante do que o resultado (embora, claro, ainda há dúvidas se realmente isso pode ser aplicado em todas as esferas de ambas as discussões – política e eventos públicos de grande porte organizados por cidadãos comuns).
Para a política, há um sentimento gritante de que tudo está igual e que, hoje, não há diferenciação entre os grandes candidatos (mais conhecidos, com grande apoio, mais tempo na televisão, e pertencentes a partidos maiores). Como, então, sair da lógica de que não há outro meio sem ser seguir a ideia do “eu não quero aquele, logo, quero o outro”, de “não me identifico com ninguém, mas aquele ali eu não quero nem morto”? O processo político, hoje, parece estar fechado para discussões mais amplas sobre como envolver o cidadão na construção de todas as etapas, seja da campanha, das políticas públicas e da participação das decisões na comunidade (tanto por subprefeituras, quanto por associações de bairro). E como criar outros tipos de participação política que envolvam desde decisões de campanha até destinação do orçamento para o bairro?
Eu realmente acredito que a rede pode ajudar nestes processos políticos. Não como fim (a interatividade pela interatividade), mas como meio, como processo. A meta deve ser, por exemplo, a maior participação pública das comunidades no orçamento das subprefeituras. Daí, questiona-se o óbvio: mas como? E tem a rede e tantas outras alternativas (reuniões abertas em áreas públicas, participação via carta, jornais de bairro e por aí vai) como possíveis soluções. O novo é o processo (usar a rede como intermediação), e não o fim (melhorar a participação).
Já na situação para a festa junina no Minhocão, a questão está em ambas as partes, tanto no processo, quanto no produto. A organização é feita de forma colaborativa, ou seja, ajuda quem quer e tem disponibilidade. As atividades da festa também são realizadas sob o conceito de “cuidadoria”, assim como aconteceu durante o Festival BaixoCentro, em que não há escolha definida para chegar a uma estética (como acontece na tradicional curadoria), mas sim todos os projetos são amparados pela equipe e se discute sua viabilidade. As comidas típicas foram trazidas para um grande piquenique colaborativo, sendo que o público e a organização deveria ser responsável por produzir os pratos tradicionais. Não havia barracas que vendiam alimentos (até porque é proibido por lei), banheiros químicos espalhados pelo viaduto (precisa-se pedir autorização para a prefeitura e existem vários bares na região que poderiam resolver o problema) ou prendas super caras para as brincadeiras. É tudo colaborativo. Desde a feitura, até a execução.
O problema é que fugir um pouco do convencional traz conflitos entre a proposta e o que se esperava do evento. Entender que a festa não era uma quermesse de igreja, patrocinada pelo governo ou subsidiada e organizada por uma empresa é um tanto quanto complicado quando nosso imaginário já está acostumado com esse estilo de festa junina. Mesmo sabendo que é um piquenique colaborativo, cadê a comida às 12h para se almoçar? Onde estão o quentão e o vinho quente? Cadê o salsichão?
Tudo isso é muito novo e os processos e resultados vão se adaptando conforme as necessidades da situação. É muito difícil entender qual é o melhor e mais certo caminho para se percorrer, porque, afinal, os caminhos estão sendo construídos agora. E é mais difícil ainda atender às expectativas quando não só o processo é recente, mas também o resultado. Os dois são tão novos que fica difícil a explicação para ambos.
O que se sabe por certo é que nos dois exemplos sempre tem espaço para mais um…
Imagem tirada pela cobertura do Fora do Eixo da Festa Junina no Minhocão