Festival BaixoCentro: as ruas são para dançar

Há anos o centro de São Paulo grita por socorro. A degradação da região central – impulsionada pela especulação imobiliária e falta de políticas públicas concretas para a sua preservação – trouxe situações intoleráveis para a maior metrópole de um país cuja a economia é a sexta maior do mundo. E como solucionar problemas complexos, que envolvem vidas e comportamentos, em um prazo mais curto? Com ações policiais é que não é…

A prefeitura, junto com o governo do estado de São Paulo, fizeram uma ação para acabar – ou, pelo menos, dispersar – o tráfico e consumo de drogas na região que o próprio governo cunhou – para dar a maior ideia de degradação – de “Cracolândia”. Não à toa a operação se chama “Sufoco”. A Polícia Militar, para trazer ares de problema resolvido, foi chamada para tratar de um assunto que é, em grande parte, social: o dependente químico. A região da Cracolândia, que não é um lugar específico pois os usuários andam pelas ruas centrais, é conhecida por abrigar muito mais consumidores do que produtores da droga. A situação, logicamente, deveria ser tratada, então, com agentes de saúde e centros de reabilitação. A presença militar deveria acontecer apenas em último caso, e não em primeiro.

O que aconteceu por ali faz parte de um projeto maior intitulado “Nova Luz”, que prevê a demolição de cerca de 30% da região para construir novos espaços. A ideia é fazer com que o bairro seja valorizado e que as moradias mais pobres ou ocupações de prédios abandonados saiam da área. Isso se chama “gentrificação” – eu gosto de chamar de higienização. É quando retiram as classes menos favorecidas de uma determinada área para “limpá-la” e torná-la aprazível para as classes mais ricas.

Para entender melhor toda a situação, veja esse mini-documentário com entrevistas com as pessoas que atuam diretamente na região:

A Casa de Cultura Digital está localizada a poucas quadras da região e já presenciou diversas situações com os usuários de drogas que ficam por ali (eu nem vou descrever aqui, porque não vale a pena…). Foi por viver próximo – e por tantos outros motivos também – que pensamos que a melhor forma de resolver os problemas que passavamos seria pegar as ruas de volta para a sociedade. Como assim? Trazer as pessoas para passear à noite, para sentar na praça, para ver uma peça de teatro em pleno Minhocão no horário em que ele está fechado para o tráfego de automóveis. Trazendo as pessoas de volta às ruas, os índices de criminalidade caem rapidamente, como demonstram diversas cidades do mundo.

O Festival BaixoCentro surge como uma resposta à disputa pelas ruas da cidade. Em articulação com mais de 30 centros e instituições culturais da região, queremos promover um mês de espetáculos e apresentações em plenas ruas do centro da cidade em março. E toda a programação será criada colaborativamente: se você quer se apresentar, é só mandar a sugestão. Todos os processos são para ser colaborativos, inclusive o financiamento.

Para angariar parte da verba necessária para a realização do Festival, que está orçado em mais de R$ 95 mil, cadastramos o projeto no Catarse.me para conseguir R$ 56 mil via financiamento coletivo. Queremos que as pessoas se sintam responsáveis pelo projeto, pelo Festival e, mais ainda, pela disputa pelas ruas da cidade. Queremos que as ruas sejam nossos palcos e feitas, também, para dançar.

O Festival, mais do que atividades culturais gratuitas, é uma forma de mostrar que as pessoas exigem, querem e planejam voltar para as ruas. Que ações policiais não resolvem o problema, porque, afinal, nem o próprio governador se sentiu confortável de sair de seu carro ao visitar a região. É uma forma de levantar a bandeira de cobrança de melhores políticas públicas para a região. Se eles, governantes, não fazem, o Festival BaixoCentro é um convite para que nós, então, façamos.

O financiamento coletivo vai só até QUARTA-FEIRA, dia 18 de janeiro, e ainda falta muito dinheiro para ser arrecadado. Então, acesse o site e contribua! Afinal, quanto custa um ingresso para o cinema hoje? E para o teatro? E para um espetáculo de dança? De R$ 20 a R$ 100, certo? Por que não garantir com esse dinheiro, em vez de apenas um espetáculo, um mês inteiro de atividades culturais?

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