Produção acadêmica sob vigília

Vamos imaginar um cenário: um aluno qualquer de uma universidade entra na biblioteca da instituição, com seus milhares e milhares de livros e artigos, e consulta mais de quatro milhões (milhões!) de trabalhos nesta visita. Não interessa quanto tempo ele levaria para conseguir fazer isso, mas todos os artigos estavam lá disponíveis para quem tivesse acesso à biblioteca. Você acha que ele deveria ser preso por isso?
Uma situação semelhante aconteceu com Aaron Swartz, acadêmico, fundador e diretor do Demand Progress, uma organização política que trabalha pela aprovação de políticas públicas progressistas. A diferença é que ele, realmente, foi preso.
O também controverso co-fundador do site Reddit, Swartz ganhou acesso, por causa das pesquisas junto ao MIT (Massachussets Institute of Technology), aos artigos acadêmicos publicados na platafroma JSTOR, uma outra empresa sem fins lucrativos que digitaliza e organiza em arquivo digital os artigos e publicações acadêmicas. O hacker e ativista ficou de setembro de 2010 até janeiro deste ano fazendo o download de cerca de quatro milhões de artigos para o seu computador. 
Por causa do sobrepeso no servidor da empresa de arquivo, Aaron foi acusado de tentar derrubar o serviço com o sobrecarregamento e alegaram que os arquivos seriam usados em redes peer-to-peer (torrents e outros sistemas de compartilhamento) para distribuir, gratuitamente, os documentos que, teoricamente, são pagos. Aaron, por sua vez, não fez nada disso. Pelo contrário, até devolveu todos os documentos.
O caso ainda será julgado em setembro, mas é uma ocorrência grave quando estamos discutindo produção acadêmica, material de pesquisa e modelo de negócio envolvendo conhecimento. Sem entrar na questão de perseguição política (já que Swartz fez um trabalho há uns anos baixando, analizando e cruzando 441.170 artigos para descobrir as suas fontes de financiamento e concluindo o grau de influência que as instituições que davam o dinheiro tinham sobre o que era publicado), a prisão de Aaron mostra o quão vulneráveis ainda estão os limites entre o que é aceitável online e o que não. E como a justiça – seja estadunidense, francesa ou brasileira – ainda usa o desconhecimento sobre a rede para podar e até censurar pesquisas acadêmicas que são de interesse público.
Vale fazer uma rápida explicação sobre os artigos que Aaron baixou para a sua máquina. Nos Estados Unidos, os pesquisadores-autores não recebem para escrever. A instituição de ensino também não lucra financeiramente. Apenas as editoras de publicações são que recebem o dinheiro ao fechar o conteúdo a quem eles quiserem ou a quem pagar por alguma quantia. Os artigos, por exemplo, que Aaron usou em suas pesquisas custavam, cada um, cerca de US$ 19. Se ele fosse comprar um a um para fazer a pesquisa sobre o financiamento, teria que arcar com US$ 8.382.230! Repetindo: mais de US$ 8.3 milhões!
Considerando que o autor nem a universidade ganham neste modelo de arrecadação, a situação de Aaron está sendo usada para levantar críticas e questionamentos sobre como mudar esta realidade para as produções acadêmicas. E Aaron até faz questão de ajudar: disponibilizou online, por meio de ferramentas de peer-to-peer como torrent, 18.592 artigos (o que dá cerca de 33Gb de arquivo) que deveriam ser gratuitos, mas que não são.
E como ele diz: “eu tinha esses documentos durante muito tempo, mas eu estava com medo de que se publicasse eu seria protagonista de perseguições legais injustas por aqueles que lucram com o controle do acesso a esses trabalhos. Eu, agora, acredito que eu fiz a decisão errada.”
Vale acompanhar e questionar!
Imagem tirada por Christopher Chan

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